Novas vitórias: Eliud Kipchoge
Atletas*
A sua maratona histórica de 1:59:40 foi apenas o começo. Agora, o Eliud Kipchoge serve-se das suas conquistas super-humanas para inspirar as pessoas em todo o mundo a repensar o seu potencial.
This is a modal window.
Dorme sempre no beliche de cima no campo de treinos. Adora a música da Kelly Clarkson. Além disso, está a iniciar um movimento mundial que vai muito além do desporto. O estatuto lendário do Eliud Kipchoge foi consolidado quando quebrou a mítica barreira de duas horas da maratona. Agora, aqueles que o conhecem partilham um retrato íntimo de uma lenda que está a redefinir o sucesso.
Um herói humilde
Quando Gloria Kosgei, advogada de Eldoret, cidade natal do Eliud Kipchoge, no Quénia, conheceu pela primeira vez o lendário maratonista, ele fez algo que a surpreendeu: apresentou-se.
"A primeira vez que nos conhecemos, ele foi extremamente simpático. Disse: «Gloria, o meu nome é Eliud.» Teve de se apresentar. Quem não conhece o Eliud?", diz, entre risos.
Agora amiga próxima do Kipchoge, Gloria revela a natureza despretensiosa do corredor, uma caraterística que lhe valeu veneração e respeito no seu país natal e não só.
"Todos falam sobre a sua humildade", afirma Gloria. "No Quénia, temos muitos grandes atletas, mas encontrar um atleta da sua classe com a sua humildade, é algo raro. Ele não procura tratamento especial, espera na fila pela sua vez, como todos os outros. O Eliud é um atleta reconhecido, mas não se vê assim. Ele diz-te: «Sou o Eliud. Nada mais»."
"O Eliud é um atleta reconhecido, mas não se vê assim. Ele diz-te: «Sou o Eliud. Nada mais.»"

Advogado de longa data de Kipchoge, Richard Cheruiyot, conhece-o há mais tempo do que a maioria. Richard, que também vive em Eldoret, mantém uma relação próxima com o Eliud há mais de 20 anos e afirma que, apesar do sucesso de Kipchoge, a atitude do homem, e os seus hábitos de sono, não mudaram.
"No início, quando não era conhecido, costumava ir para o campo de atletismo em Kaptagat, no Quénia. Tornou-se campeão mundial, mas continua a ir ao campo e dorme na parte de cima do beliche. Não hesita em fazê-lo", conta Richard, mostrando-se perplexo com a atitude do seu cliente e amigo.
"Quando não está no campo, devido à sua popularidade, tende a tornar-se uma espécie de íman. As pessoas aproximam-se dele para fazer perguntas ou tirar selfies e eu nunca o vi rejeitar ninguém."
A consistência reina
O Kipchoge reflete outro traço que inspira aqueles que o conhecem: uma disciplina inabalável. Emilie Mullier Charrier, agente imobiliária e maratonista de Berlim que o conheceu na Maratona de Berlim de 2018, refere que depois de conhecer o Kipchoge ganhou motivação para treinar de forma mais séria e, como resultado, reduziu uma hora ao seu tempo de maratona. Mas os benefícios dessa mentalidade foram muito além do treino.
"O Eliud influenciou-me muito", comenta. "Quando vês a sua disciplina, a sua consistência e dedicação para correr, queres fazer o mesmo. Também aplico a mentalidade dele na corrida à minha vida profissional. Ter um plano, um programa, dar o meu melhor todos os dias, mesmo que não seja boa. Quero dar sempre o meu melhor e ser melhor do que ontem, como ele."

Outra discípula de Kipchoge é a Usila Koech, gestora de empréstimos de Las Vegas. A família de Usila mantém uma relação próxima com o treinador do Kipchoge, Patrick Sang, há mais de 30 anos. Os seus dois filhos são corredores e, tal como a Emilie, adotaram a ética de trabalho do Kipchoge.
"Em 2019, toda a nossa família foi para o Quénia e pedimos-lhe que se encontrasse connosco, apesar de sabermos que estava a preparar-se para tentar correr uma maratona em menos de duas horas em Viena. Apareceu a horas e deu-nos toda a atenção. Abraçou os rapazes, ofereceu-lhes um grande sorriso e um abraço caloroso. Partilhou a sua história, perguntou aos rapazes quais eram os seus sonhos e disse-lhes: «Vão conseguir fazer tudo o que quiserem. Só precisam de ser disciplinados. Têm de ser consistentes. Têm de trabalhar arduamente.»"

Partilhou a sua história, perguntou aos rapazes quais eram os seus sonhos e disse-lhes: "Vão conseguir fazer tudo o que quiserem. Só precisam de ser disciplinados. Têm de ser consistentes."
A família Koech tirou uma fotografia com o Kipchoge nesse dia. Meses mais tarde, estavam entre a multidão quando Kipchoge correu a sua maratona histórica em Viena. A experiência e as conversas que tiveram com o Kipchoge antes da corrida marcaram profundamente os filhos de Usila.
"Conhecer o Eliud mudou a forma como veem o mundo de forma geral", afirma Usila. "Temos esta piada na nossa família em que em vez de dizermos «o que faria Jesus?» como a maior parte das pessoas, dizemos: «o que faria o Eliud?» Pensamos assim porque não te tornas excelente fazendo coisas medíocres. Tornas-te excelente por seres extremamente disciplinado e consistente."
This is a modal window.
Promover a inspiração
A abordagem do Kipchoge ao sucesso é inspiradora porque faz com que qualquer objetivo pareça alcançável. Madhvi Dalal, farmacêutica nascida no País de Gales e fundadora de uma empresa sem fins lucrativos em Nairobi que visa combater a pobreza menstrual, testemunhou a magia do Kipchoge em primeira mão quando fizeram voluntariado juntos no condado de Samburu, no Quénia.
"O casamento infantil e a gravidez precoce são comuns nesta parte do país", explica a Madhvi. "Ensino as raparigas sobre a saúde menstrual e os direitos sexuais. Porém, o Kipchoge ensinou-lhes muito mais. Disse-lhes: «A vitamina N é o direito de dizer não. Isso é mais importante do que qualquer outra vitamina. Têm o direito de dizer não.» E acrescentou: «O vosso melhor amigo é um livro.» Muitas raparigas não se esqueceram disso. Dois meses depois, quando as pessoas perguntavam: «O que queres ser quando fores grande?», elas respondiam que queriam ser engenheiras, pilotos, etc. Ele deu-lhes esperança."
Enquanto o Kipchoge deixou as raparigas da Madvhi a sonhar com as suas futuras carreiras, o Elijah “Eljay” Mutua, graffiter de Nairobi, cita o corredor como uma influência contínua que impulsiona a sua arte.
"O Kipchoge inspirou-me a acreditar que podes ser imparável", afirma Eljay. "A maior lição que aprendi foi manter-me fiel a mim mesmo, aconteça o que acontecer. A tua personalidade reflete-se sempre no teu trabalho. É como uma assinatura. Portanto, quando te encontras, encontras a chave para tudo o resto."
"O Kipchoge inspirou-me a acreditar que podes ser imparável."

O verdadeiro legado
De Eldoret a Las Vegas, o Eliud utiliza o seu dom não só para quebrar recordes, mas também para inspirar e incentivar os outros a prosseguirem o seu objetivo. Quer seja um recorde pessoal, uma nova meta ou um futuro melhor, o Kipchoge mudou o rumo da vida destas pessoas, ajudando-as a ultrapassar os seus próprios obstáculos e a atingir os seus próprios objetivos.
Esta comunidade global de pessoas convictas nas suas próprias capacidades ilimitadas é o verdadeiro legado do Kipchoge, que irá perdurar para além das suas medalhas de ouro, da sua velocidade super-humana e dos seus momentos brilhantes num pódio. No final da nossa entrevista, Usila Koech, cuja família inteira vive segundo o lema "O que faria o Eliud?", explica a alma desse legado.
"Penso que a sua missão, e acredito nisto de alma e coração, é fazer do mundo um lugar muito melhor."
Muralista: Elijah "Eljay" Mutua
Fotógrafos: Kyle Weeks e Chris Anderson
This is a modal window.
