Como saltar mais alto, correr mais depressa e ter um melhor desempenho

Orientação

Os cientistas explicam como fortalecer os tecidos musculares para maximizares a potência.

Última atualização: 23 de dezembro de 2020
Saltar mais alto, correr mais depressa e ter um melhor desempenho

Os cangurus conseguem saltar 1,83 m na vertical e cobrir até 7,6 m num único salto largo. Poderíamos pensar que têm gémeos enormes. Mas, na verdade, têm pernas longas e estreitas, como alguns dos melhores corredores de fundo (estamos a pensar em ti, Kipchoge).

Isto porque a potência de um canguru não vem apenas dos seus músculos, mas também da energia cinética (ou energia em movimento, o tipo que usamos para atirar uma bola, levantar pesos ou fazer um salto de caixa) na sua fáscia, uma rede de tecido conjuntivo em todo o corpo. Os estudos mostram que, tal como a fáscia do canguru, a fáscia humana pode armazenar energia cinética. Na verdade, a fáscia humana pode armazenar mais energia cinética do que qualquer outro tipo de tecido no corpo. Por isso, se mantivermos a nossa fáscia forte e saudável, temos potencial para saltar mais alto, correr mais depressa e ter um melhor desempenho.

"A geração de energia cinética acontece nos músculos", afirma Robert Schleip, doutorado e diretor do Fascia Research Project na Universidade de Ulm, Alemanha. "Contudo, se pudermos armazenar temporariamente essa energia no tecido que circunda esses músculos, esse tecido pode libertar uma aceleração mais rápida do que as fibras musculares seriam capazes por si só. Na verdade, o tecido pode devolver a energia numa fração de segundo para permitir saltos e uma aceleração incríveis."

Essencialmente, os nossos músculos ainda têm de criar a potência necessária para movimentar o corpo, mas a fáscia pode ajudar-nos a amplificar essa potência sem consumir energia dos músculos subjacentes.

"O tecido pode devolver a energia numa fração de segundo para permitir saltos e uma aceleração incríveis."

Robert Schleip, doutorado e diretor do Fascia Research Project na Universidade de Ulm, Alemanha

"Pensemos na fáscia como um rolo contínuo e dinâmico de película de plástico que divide, compartimenta, foca o movimento e permite que aquilo que poderia ser considerado uma série aleatória de músculos, nervos, vasos sanguíneos e órgãos atue como um todo coletivo", explica Rebecca Pratt, doutorada em anatomia na Faculdade de Medicina William Beaumont da Universidade de Oakland. Os tipos de fáscia também incluem tendões, cápsulas de articulações, ligamentos e tecidos conjuntivos intramusculares, refere Schleip.

Os tendões têm um padrão de onda chamado "crimp", explica Schleip. "Quanto mais crimp tiver um tendão, mais capacidade de armazenamento tem." Pensemos na corrida, por exemplo. Quando o pé atinge o solo, exercemos tensão sobre o tendão de Aquiles, o que faz com que o crimp do tendão se endireite temporariamente para armazenar energia cinética. Quando empurramos o chão, o tendão regressa ao crimp anterior; é esse recuo que nos impulsiona para a frente. Quanto maior for a capacidade de armazenamento do tendão, maior será o impulso.

"Estudos com animais demonstraram que, após três meses de corridas regulares, há um aumento do crimp do tendão", afirma Schleip. Isto sugere que, da mesma forma que o treino de força aumenta o tamanho do músculo ao longo do tempo, podemos melhorar a quantidade de crimp nos tendões e, por conseguinte, a capacidade da fáscia de alimentar o nosso corpo através do movimento.

Correr não é a única forma de desenvolver a capacidade de armazenamento cinética da fáscia. "As pessoas que praticam exercícios pliométricos [exercícios de salto] treinam os seus músculos para contraírem menos, ao mesmo tempo que armazenam energia de forma mais eficiente", diz Schleip. Isto acontece porque, quando saltamos, a fáscia alonga-se e encurta-se rapidamente, criando o crimp. Estudos sugerem que após três meses de treino pliométrico regular (que os peritos normalmente concordam que deve ser feito a cada 48 horas, no máximo), os tendões demonstram mais recuo e crimp. Mesmo algumas séries de 10 segundos de saltos de pogo algumas vezes por semana podem beneficiar o tecido.

Seguem-se três outras formas de melhorar o crimp e manter a fáscia saudável.

  1. Alongamentos
    As cadeias miofasciais são linhas de tecido conjuntivo que percorrem o corpo. A investigação de Schleip demonstrou que poses que utilizam as cadeias mais longas possíveis podem ajudar a fáscia a tornar-se mais elástica. Estas incluem inclinações laterais em pé com os braços acima da cabeça, um lunge longo com rotação do tronco ou algo que nos faça sentir um alongamento dos ombros até às pernas.
  2. Hidratação
    A fáscia é constituída por proteínas e açúcares que ligam a água como uma esponja. Quanto mais desidratada estiver a fáscia, menos dinâmica é, refere Pratt. Quanto mais desidratada e estática for, mais rígidos e densos se tornam os seus componentes, restringindo os músculos subjacentes. "Se a fáscia não estiver em harmonia com os músculos, qual será a quantidade de movimento e força que vamos realmente conseguir realizar?" pergunta Pratt. "Numa batalha entre o músculo e a fáscia cronicamente rígida, a fáscia vai ganhar sempre." Manter a hidratação, especialmente depois de um treino, pode ajudar a garantir que a fáscia não inibe o desempenho.
  3. Rolamentos
    Exercícios com o rolo de espuma também ajudam a transportar água para regiões com colagénio mais rígido, um tipo de fibra na fáscia, e a soltar a fáscia, afirma Pratt. A aplicação de pressão através do peso corporal no rolo ajuda a libertar componentes fasciais pegajosos e a lavá-los com água. O uso do rolo de espuma em diferentes partes do corpo durante 90 a 120 segundos pode reduzir a rigidez muscular e aumentar a amplitude de movimentos, de acordo com uma análise de vários estudos. Ajuda a fáscia a regressar à homeostase em vez de se amontoar depois de um treino exigente.

    Contudo, não é um tratamento pontual. "Se tivermos dores nas bandas iliotibiais [o longo pedaço de tecido conjuntivo que percorre a parte externa de perna desde a anca até ao joelho], precisaríamos de utilizar o rolo nos quadris, nos isquiotibiais e nas bandas iliotibiais para aliviar a dor", afirma Pratt. Quando a fáscia se torna rígida, pode causar limitações e dor, mas a zona onde essa dor se manifesta não é necessariamente onde está o problema. O rolo de espuma deve ser um plano de tratamento holístico, diz, porque a fáscia está toda ligada.

Data de publicação original: 6 de novembro de 2020