Inimigas no ringue, amigas fora dele

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As lutadoras deste ginásio feminino em Xangai criam laços ao quebrar as normas associadas ao género e ao encontrar a sua força interior.

Última atualização: 8 de março de 2022
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Em boa companhia: inimigas no ringue, amigas fora do ringue 

"Em boa companhia" é uma série sobre equipas e clubes desportivos que desafiam o sistema estabelecido.

Num clube de boxe discreto em Xangai, um grupo de mulheres (professoras, gestoras, mães a tempo inteiro, entre outras ocupações) calça as botas e protege os nós dos dedos. Pesos de mão rosa forte e luvas vistosas decoram a sala da receção. O som das luvas a bater nas almofadas sincroniza-se com batidas eletrónicas de alto volume e energia elevada. O riso ecoa nas paredes do Princess Women’s Boxing Club enquanto membros do clube contam piadas antes de entrarem no ringue.

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Alunas praticam os socos no saco de areia no Princess Women’s Boxing Club.

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Zhong Zheng (acima) prepara-se para uma sessão de combate. Gong Jin (abaixo) e Zou Qiang (no centro à direita) riem-se durante a aula.

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Zou Qiang concentra-se antes do treino.

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Alunas praticam os socos no saco de areia no Princess Women’s Boxing Club.

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Zhong Zheng prepara-se para uma sessão de combate.

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Gong Jin (no centro à direita) e Zou Qiang riem-se durante a aula.

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Zou Qiang concentra-se antes do treino.

O clube de boxe acolhe uma comunidade de lutadoras que vem pelo treino, mas acaba por ficar pela camaradagem. Embora o boxe possa não ser considerado um desporto de equipa, este lugar e estas mulheres provam que certamente o é: juntas, treinam para aumentar a confiança, reforçar a força física e mental e deixar qualquer cético KO.

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Jin Yang pratica o seu boxe sombra.

O clube começou num estúdio de dança alugado em 2010. Organizado por Gong Jin, que inicialmente estava apenas à procura de um espaço onde algumas das suas amigas pudessem praticar boxe, o Princess Women’s Boxing Club é agora um clube completo com duas localizações em Xangai, uma dúzia de treinadoras e centenas de membros.

Encontrando-se várias vezes por semana em aulas de 10 a 15 pessoas, estas mulheres formaram laços que transcendem o boxe. "Somos como uma família", afirma Gong Jin, que colocou as luvas pela primeira vez aos 12 anos, encorajada pelo seu pai, que praticou boxe na juventude. Seis anos mais tarde, começou a lutar profissionalmente e, agora, aos 32 anos, continua a dar o máximo.

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Zou Qiang, He Yue e Li Chaoqiong observam as suas colegas de equipa no ringue.

Da esquerda: Zou Qiang, He Yue, Li Chaoqiong, Sang Ying e Wang Lei observam as suas colegas de equipa no ringue.

Ao seu encargo estão Han Beiying, que recentemente passou de aluna a treinadora a tempo parcial, e Zhong Zheng, que treina com o clube duas vezes por semana há mais de quatro anos. Juntamente com Ge Fangxin e Du Jingjing, veteranas experientes do Princess, discutem como as jovens mulheres chinesas estão a desafiar conceções antigas para definir novas ideias.

Falamos sobre os laços criados através do combate, KO e dar gás.

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Zhong Zheng (à esquerda) e Han Beiying trabalham em conjunto na aula.

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Na foto: Han Beiying

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Zhong Zheng (à esquerda) e Han Beiying estão prontas para entrar em ação.

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Han Beiying (em baixo) e Zhong Zheng descontraem com alongamentos assistidos.

Portanto, não são permitidos rapazes no Princess. Por que é importante ter um clube de boxe exclusivamente feminino?

Gong Jin: A forma masculina de lutar foca-se mais na força e na resistência. No caso das mulheres, carateriza-se pela técnica, a precisão e a estratégia certa. Num grupo com vários rapazes, sinto que tenho algo a provar a mim mesma. Queria treinar com outras mulheres, mas na altura não havia um sítio onde pudéssemos praticar. Foi assim que começou.

Han Beiying: Não há muitos ginásios de boxe para mulheres na China e, na verdade, penso que eramos o único quando começámos. É um local seguro para praticarmos onde não temos de nos preocupar com o facto de os socos serem demasiado pesados.

Zhong Zheng: Gosto da privacidade do treino em aulas pequenas com as minhas amigas mais próximas, bem como do nível elevado de orientação com mulheres que compreendem o que sentes.

Porquê o rosa?

Gong Jin: [Risos] Eu sei que nem todas as raparigas gostam de rosa. É apenas a minha cor favorita. Não significa que um ginásio só para mulheres tenha de ser rosa.

Como é fazer parte desta comunidade?

Gong Jin: Apoiamo-nos verdadeiramente umas às outras. Quando as nossas colegas de equipa estão a lutar, gritamos os seus nomes e dizemos " lín jiāyóu." [" lín" corresponde aos dois primeiros carateres do nome chinês do ginásio, que é a primeira parte da transliteração de "Princess". "Jiāyóu" traduz-se para "dá-lhe gás" no sentido encorajador de "vai em frente" ou "força" da frase.] Normalmente, o ginásio inteiro enche-se com as nossas vozes de apoio bem altas.

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Chang Yiting observa uma sessão de combate.

O que é que praticar boxe com este clube vos ensinou?

Han Beiying: Ensinou-me sobre trabalho em equipa e tolerância. Apesar de estar só uma mulher no ringue, tens uma treinadora e companheiras a treinar contigo. Na verdade, é um desporto de equipa. É realmente assustador quando vês um soco a vir em direção ao teu rosto, mas com a prática e o trabalho em equipa, aprendes a dar o soco perfeito.

Gong Jin: Ensinou-me a ser corajosa e a tornar-me independente. O boxe não é uma questão de iniciar uma luta, mas sim de seres capaz de te defender.

Zhong Zheng: No início, quando tinha combates, ficava nervosa e só me importava com ganhar. Mas, à medida que o tempo foi passando, aprendi que [o boxe] se relaciona mais com mostrar respeito ao meu rival, ao aplicar todas as competências que aprendi com o treino e com as minhas colegas de equipa, e com dar o meu melhor.

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O corgi de Gong Jin, Wukong, lidera uma reunião de equipa depois da aula.

Como é que os laços formados no ginásio se traduzem para a vida fora do ringue?

Gong Jin: Tornámo-nos amigas muito próximas. Conversamos quando estamos a preparar-nos e, muitas vezes, vamos comer fora juntas depois do treino. Muitas de nós já nos conhecemos umas às outras há muito tempo, por isso, criámos laços muito próximos.

Han Beiying: No ringue, damos socos como inimigas, mas quando estamos fora do ringue, somos mais do que apenas companheiras de treino. Queixamo-nos dos nossos patrões e dos nossos colegas de trabalho nos grupos WeChat. Temos este libertar de tensão com o boxe que todas partilhamos. E, quando estás com problemas, seja no trabalho ou na tua vida pessoal, tens essa rede de apoio incrível que está lá para ti.

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Da esquerda: Xu Jie, He Yue, Zhong Zheng, Wang Lei, Zou Qiang

Como é que o boxe está a mudar a perceção das mulheres na China?

Ge Fangxin: Na altura em que comecei [há seis anos] não havia muitas mulheres dispostas a experimentar praticar boxe. Mas, à medida que o tempo vai passando, mais mulheres se juntam e vão ficando. É emocionante ver mais mulheres a tomarem conhecimento do seu poder através do boxe.

Du Jingjing: Mais pessoas estão a começar a aceitar o boxe como um desporto feminino, em vez de o associar apenas à violência. Estamos a dominar a beleza do nosso poder.


Depois do treino, Gong Jin tira as luvas e desenrola as proteções dos nós dos dedos. O seu corgi, Wukong, aproxima-se e ela coloca-o sobre os seus joelhos antes de o virar de costas para fazer uma festa na barriga. As outras raparigas juntam-se e riem-se. São as mesmas mulheres que entraram no estúdio de boxe algumas horas antes. Mas consegues perceber pela sua postura que algo mudou. Através de uma série de rondas de combate, estabeleceram novamente ligação de forma palpável a este poder de que Du Jingjing falou. Agora, estão prontas para enfrentar qualquer situação. Uma partida importante, uma reunião de diretores, um dia mau: esquivar, socar, knockout.

Texto: Crystal Wilde
Fotografia: Luo Yang

Escrito em: setembro de 2020

Data de publicação original: 9 de março de 2022

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